OPINIÃO
Dois anos depois do início da Covid19 há que lamentar
muitas vítimas mas é visível que a resposta portuguesa à pandemia foi, no
essencial, boa. Os percalços, erros e omissões que aconteceram eram, no
geral, inevitáveis e não invalidam o
facto de que, globalmente, houve capacidade de planificação, coordenação e
ação o que é especialmente significativo
num país que não dispõe de recursos financeiros minimamente comparáveis com a
França, o Reino Unido, a Bélgica, a Espanha ou os EUA onde, como se sabe, tudo
correu bastante pior.18 maio 2021 | 16h30
Há que reconhecer que no Serviço Nacional de Saúde (SNS), desde os seus diversos trabalhadores até à ministra da tutela passando pelos responsáveis aos vários níveis, souberam agir de forma articulada, flexível e célere com uma eficácia que só por manifesta miopia ou por interesses particulares alguns pretendem desvalorizar. Esta capacidade de adaptação, empenhamento e resposta é tanto mais notável quanto, desde 1990, houve uma contínua intervenção de sucessivos responsáveis políticos para destruir a capacidade do SNS e desvalorizar o trabalho dos prestadores de serviço público em favor da idolatria (e do lucro) do "mercado" da doença.
A realidade evidenciou que para salvaguarda da saúde
individual e coletiva dos portugueses é indispensável uma rede de 'saúde
pública' consistente e entrosada com todas as demais entidades do SNS desde o
nível nacional (SNS24, INEM, etc) até ao de maior proximidade (ACES, Centros de
Saúde, Unidades Hospitalares, etc) Só a possibilidade de planificação e de
articulação de toda esta vasta e diferenciada estrutura (o SNS) permitiu uma
intervenção controlada, em tempo e equitativa em todo o território nacional ao
longo das várias etapas da pandemia.
Na atual fase de vacinação o panorama é idêntico. Com
exceção de algumas, poucas, situações que os media corporativos bastante têm
procurado empolar, a vacinação tem decorrido com um ritmo adequado e com uma
notável capacidade organizativa.
A experiência dos milhões de portugueses já vacinados
testemunha que, regra geral, o processo decorre bem sobretudo tendo em conta a
sua enorme dimensão e o curto tempo disponível. Nestas matérias pena é que a
União Europeia não tenha funcionado com a mesma flexibilidade e diligencia que
as entidades portuguesas.
É neste quadro que entristece ver como alguns não têm escrúpulos em se aproveitarem do trabalho alheio, procurando ofuscar o papel dos trabalhadores do SNS para recolherem indevidos lucros partidários e eleitorais.
No concelho de Cascais, como no resto do país, os Centros
de Saúde, as equipas de saúde pública e o Hospital, em articulação com outros
serviços (segurança social, bombeiros, etc),
garantiram o essencial da resposta à Covid-19 desde os primeiros dias
até à vacinação que está em curso. A
Câmara Municipal ao longo destes dois anos deu algum apoio mas, como se sabe,
foi muito mais o 'show-off' (a câmara frigorífica para
os mortos que
felizmente não foi utilizada, as máquinas de distribuição
de máscaras que nunca
chegaram a funcionar, etc) e a
propaganda (desde a profusão de cartazes que
inundam o concelho até às
sucessivas 'iniciativas' mediáticas como a de anunciar a produção de
vacinas em Cascais)
do que as contribuições efetivamente úteis.
Para a vacinação a Câmara tratou de colocar ao dispor do SNS os espaços públicos adequados (em geral pavilhões gimnodesportivos) e alguns jovens voluntários para apoiarem os profissionais que asseguram o processo de vacina. É o SNS (desde os enfermeiros aos administradores e demais intervenientes) que garante todo o percurso essencial da vacinação e só haveria que registar positivamente alguma colaboração da Câmara não fora o espetáculo de indigno aproveitamento eleitoralista que aquela está a fazer.
As dezenas de milhares de cascalenses que já foram vacinados com que ideia ficaram ?
Nos pavilhões de vacinação viram inúmeros cartazes e
painéis de propaganda da Câmara. Enquanto estiveram no 'recobro' tinham à sua
frente um écran onde passava a publicidade da Câmara.
Segundo cuidou de saber Pedro
Jordão (um
'resistente' local merecedor de público elogio) a Câmara gastou (dos nossos
impostos) mais de 90.000 euros apenas nos 'materiais de decoração' com que faz
a autopromoção nos pavilhões de vacinação.
Para além da parafernália de marketing visual os
cascalenses receberam um pequeno saco com a identificação camarária onde estava
uma garrafa de água e quatro bolachas. Junto com essa 'oferta' foi-lhes dado um
panfleto que é, ele próprio, uma inconcebível artimanha eleitoralista.
Feito com reconhecida mestria, o folheto dirige-se a cada "caro cidadão" para lamentar a existência do "maldito coronavírus" e acentuar que "a Câmara de Cascais criou respostas para apoiar em todas estas frentes de guerra". Depois de enumerar várias das ilusórias maravilhas com que a Autarquia dá resposta à fome, ao desemprego e ao "empreendedorismo" a propaganda termina entusiasticamente com a afirmação de que "é assim que somos em Cascais: Todos por Todos. Tudo por Todos" (TODOS foi lema de campanha eleitoral do PSD/CDS em Cascais) e a assinatura personalizada de Carlos Carreiras.
Ensinam as regras do marketing que este despesismo propagandístico, em período pré eleitoral, certamente será retribuído em Outubro com alguns milhares de votos com que eleitores, enganados, julgarão retribuir o 'valoroso' desempenho da Câmara no incremento da vacinação.
Todavia, na parafernália de propaganda com que estão
engalanados os centros de vacinação há algo que muito provavelmente nenhum
cascalense terá visto: um símbolo ou uma outra referência a alguma das diversas
instituições que, de facto, estão a assegurar todo o processo de vacinação
desde o Ministério da Saúde até às Unidades de Saúde, passando pelo Hospital e
pelo ACES com os respetivos Centros de Saúde.
São estes que essencialmente garantem a vacinação dos
cascalenses não é a Câmara por obra e graça do seu presidente.
Como referi esta questão ao enfermeiro que me vacinou
pude testemunhar o digno inconformismo
de um profissional que fez questão de me ir mostrar o único sítio onde havia um
pequeniníssimo símbolo do ACES
(Agrupamento dos Centros de Saúde de Cascais) e do SNS. Estava escondido por
detrás das cabines de vacinação num corredor onde não passava ninguém.
Manifestada a minha admiração e tristeza uma outra profissional de saúde
respondeu-me, com visível emoção, "pena é que as minhas colegas não possam
ouvi-lo porque temos todas muita pena desta situação, andamos há meses a
trabalhar sem descanso e parece que é a Câmara que fez tudo".
Internacionalmente, ecoa a indignação com o aproveitamento partidário que Narendra Modi, primeiro ministro da Índia, tem feito do processo de vacinação. Lembrou-se aquele líder da direita extremista indiana de colocar a sua fotografia nos certificados de vacinação o que, após uma onda de protestos, foi objeto de proibição por parte da Comissão Eleitoral Indiana.
O Modi de Cascais não pode (ainda…) passar certificados de vacinação assinados por si (desejavelmente, com a fotografia de S.Exª) mas também se esmera em usar o combate à Covid-19 para propaganda em proveito próprio.
Não é que esta sua atuação tenha, agora, alguma
novidade. Há muito que, infelizmente, a Câmara Municipal de Cascais vive num
mundo de aparências e de artificiosa criação de "factos" virtuais
publicitáveis. Mas é especialmente indigno que o faça utilizando uma situação
grave que deveria merecer descrição e bom senso em proveito do maior consenso
nacional possível respeitador de todos
aqueles que têm estado valorosamente na linha da frente deste combate.
Infelizmente não será caso único. Vai-se percebendo que atitudes idênticas de aproveitamento partidário em período pré-eleitoral ocorrem em demasiadas outras Câmaras Municipais.
Esta habilidade auto-promocional é apanágio de
quantos, confundindo Poder Local com autocracia pessoal, ambicionam a municipalização da Educação, da
Saúde e de outras áreas sociais.
Anteveem com isso a possibilidade de disporem de acrescidos meios para se
dedicarem àquilo em que verdadeiramente se especializaram: o exercício do
caciquismo local mediante recurso à subsidiodependência, à intimidação, aos
'empenhos' e à propaganda.
A utilização dos centros de vacinação como espaço de
publicidade político-municipalista ilustra a
falta de ética de quem a promove. A manipulação daquilo que tem sido um
empenhamento comum da nação para um oportunismo eleitoral parolo nunca deveria
ocorrer.
É apenas por dever de homenagem a todas e a todos que,
sobretudo no SNS, há muitos meses enfrentam com sucesso a pandemia que aqui
fica esta denúncia que, apesar da indignação, é sobretudo de agradecimento e de
solidariedade.
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2 comentários:
Está mais que visto que farias melhor!!!! Mais uma vez a fazer a papel de verdadeiro sabe tudo e nada faz a não ser falar mal e tentar aparecer
Deixe de ser assim e faça algo que motive o povo de cascais!!!!
O contentor frigorífico não chegou a ser usado..???
Realmente o seu desconhecimento é para lá de muito..
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