REGIONALIZAÇÃO para ser útil não pode custar mais dinheiro aos contribuintes nem criar mais cargos políticos

OPINIÃO

24 julho 2022 | 16h07
Escrevi aqui há poucos dias sobre a regionalização, onde defendi que a mesma, para resultar, teria de abarcar algumas competências hoje a cargo das autarquias. No entanto, não serão apenas competências administrativas que devem transitar dos municípios para as regiões. Pessoal e dinheiro também devem ser transferidos. A regionalização para ser útil, não pode custar mais dinheiro aos contribuintes, nem criar mais empregos e, muito menos, mais cargos políticos. 

As Competências 

Existe uma ‘vaca sagrada’ que não se pode referir quando se fala de regionalização: A transferência de competências atualmente atribuídas aos municípios para o nível da região. É pressuposto nos discursos oficiais que a regionalização se fará pela transferência de poderes do Governo para as regiões. Ora, a regionalização só faz sentido se for buscar poderes que hoje estão a cargo das autarquias e os transferir para a região. 

O exemplo mais evidente sobre aquilo que falo será na rede viária e transportes. Hoje, os municípios têm de coordenar com os seus vizinhos as estradas que constroem e os sistemas de transportes públicos que implementam. Acontece frequentemente existirem estradas em projeto que são de enorme importância para um concelho e não o são para um concelho vizinho. Como um município não pode pagar a obra num concelho do lado, a estrada fica por fazer. 

Mais caricato é nos transportes. Os municípios já têm largas competências atribuídas nesta área, no entanto, cada um gere em função dos seus interesses locais e, amiúde, das ideias de momento às quais adere. Um dos exemplos mais caricatos do país é o facto de Cascais, Oeiras e Sintra terem previstos nos seus planos diretores a implementação de elétricos rápidos, mas as redes planeadas não se encontrarem. Explicando melhor, o sistema de elétricos previsto no PDM de Oeiras estende-se até à fronteira de Cascais, mas não no ponto onde o idêntico sistema de Cascais chega à fronteira de Oeiras. O mesmo acontece com Sintra.  

Contado não se acredita, ide ver os planos diretores municipais destes municípios. 

Como é evidente, o planeamento da rede de transportes tem de passar dos municípios para as regiões. 

Mas algo parecido se passa na educação. Não podemos andar a duplicar modelos quando uma gestão regional poderia originar ganhos para todos. Não faz sentido que concelhos que nem uma única escola secundária têm no seu território possam gerir esta área em vez de ser a região a fazê-lo. 

Ou ainda no tratamento de lixo. Hoje a recolha está atribuída aos municípios, e deve continuar a estar, mas o tratamento do mesmo necessita de ser feito por entidades que abarquem uma grande área geográfica, como acontece em toda a Europa. Os municípios associaram-se para o efeito, com algum sucesso, há que dizê-lo. No entanto, era melhor que os eleitores pudessem acompanhar o que é feito nesta matéria e isso só é possível com a implementação de regiões. 

O Dinheiro 

Como financiar tudo isto? É hoje uma evidência que muitos municípios dispõem de mais verbas do que aquelas que efetivamente precisam. O modelo de financiamento municipal, baseado em receitas do imobiliário, data dos primórdios do poder local, em que todas as infraestruturas básicas estavam por fazer. Dois terços do país não tinha saneamento básico, um terço não tinha abastecimento de água, grande parte das freguesias não dispunha de uma única estrada asfaltada de acesso. Hoje, grande parte destas infraestruturas estão feitas, mas os municípios continuam a ser financiados como se tudo estivesse por fazer. Acabam por gastar o dinheiro em coisas supérfluas, desde monumentos ao bombeiro, eventos vários ou auditórios que nunca enchem. 

Acresce que o modelo de financiamento pelo imobiliário – sobretudo IMI e IMT – cria uma enorme discrepância nos meios ao dispor das autarquias. As cidades recebem muito mais que o campo, quando, se queremos desenvolver o interior, há que investir nas zonas rurais. 

Transferir as atuais receitas do IMT e do IMI das autarquias para as regiões, será um meio de financiar o investimento destas sem criar nem mais despesa nem mais impostos. 

Também ao nível do pessoal, os quadros mais qualificados deverão ser transferidos dos municípios para as regiões. 

O Território 

Esta é outra área sensível e que tem potencial para bloquear qualquer processo de regionalização: a delimitação geográfica das regiões. Tirando o Algarve, que é consensual, em todo o resto do território continental não há acordo sobre a delimitação da respetiva região. 

A opção deve ser pelos atuais distritos. A divisão administrativa do território continental em distritos está sedimentarizada e interiorizada pelas populações já há muitos anos. Tentar encontrar uma nova divisão é abrir uma discussão interminável que irá espicaçar rivalidades entre cidades que têm a expectativa de virem a ser capitais de região. Qualquer outro mapa será a garantia que a regionalização não avança. 

Os Tachos

Mas falta ainda falar dos cargos políticos. Para além da recuperação do Governador Civil e seus adjuntos, não deve ser criado um único cargo mais. Para compensar, as vereações municipais devem ser reduzidas aos elementos que têm efetivamente poderes executivos e as assembleias municipais limitadas a um máximo de 30 elementos. 

Como em cada município existem pelo menos dois vereadores sem pelouro, se esta função for eliminada, teremos menos 556 cargos políticos no imediato. Mesmo criando um executivo de cinco elementos por região, o saldo final de lugares políticos será sempre muito negativo.  

O mesmo aconteceria com as assembleias municipais. Se reduzirmos em média dez elementos por cada um destes órgãos, serão eliminados 2780 lugares. Criando assembleias regionais de 40 elementos, teríamos 720 novos cargos, o que resultaria em menos 2060 cargos políticos. 

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