OPINIÃO
Ou a atual coligação de Carlos Carreiras vai buscar o apoio da extrema-direita ou fica numa situação em que a oposição pode, efetivamente, ser maioritária.
É
certo que há uns dias mudou o cabeça da lista anunciado pelo Chega para
concorrer à Câmara passando o operacional da extrema-direita, Pacheco Amorim,
para candidato à Assembleia Municipal enquanto o concorrente à presidência da
Câmara é agora João Rodrigues dos Santos. Tal mudança não terá certamente
significado na votação deste partido, tanto mais que o número dois do Chega
continuará a dar a cara pela candidatura e o seu atual eleitorado responde
essencialmente ao populismo do caudilho nacional.
Uma forma deplorável de estar na política
Todavia,
esta 'novidade' justifica uma outra reflexão.
João
Rodrigues dos Santos foi até há muito pouco tempo militante, em Cascais, do Partido Socialista . Conhecemo-nos dessas lides e não quero fazer
quaisquer juízos pessoais sobre alguém ter sido, durante décadas, dirigente da
JS local e ativo membro do PS-Cascais e aparecer subitamente como candidato de
uma força que se situa nos antípodas do socialismo com os mais serôdios valores
do salazarismo.
Felizmente,
com o 25 de abril ganhámos a liberdade de fazer opções mesmo quando elas
significam estar do lado daqueles que ambicionam acabar com essa mesma
liberdade. Que João Rodrigues dos Santos e mais alguns ex-socialistas se tenham
repentinamente convertido em anti-democratas fanáticos da xenofobia, da
violência e do colonialismo é, sobretudo, um problema deles.
Mas
este 'fenómeno' é preocupante enquanto consequência de uma deriva que se tem
acentuado na vida política nacional e local.
Os
partidos existem como expressão organizada de valores e projetos inerentes a
classes ou camadas sociais. Integrar um partido é querer estar com outros na
ação por essas ideias e propostas com as quais se considera haver uma
identificação conjunta. São esses princípios que justificam qualquer militância
partidária e a tentativa de alcançar o exercício de poder, nacional ou local,
só tem valia como um meio para a concretização dos objetivos comuns.
Infelizmente,
desde há uns anos parece ampliar-se uma outra visão sobre a militância
política. Demasiados "quadros partidários" assumem o seu partido como
uma espécie de clube que deve ganhar eleições para com isso, em primeira linha,
propiciar uma melhoria de vida aos seus "esforçados" dirigentes. A
militância partidária passa a ser vista não como um serviço que se pretende
prestar à sociedade mas como um processo de afirmação e progressão pessoal.
Para
estes os partidos são essencialmente agremiações facilitadoras de vedetismos,
empregos e 'empenhos' num jogo em que as 'alternâncias' e 'oposições' são
apenas parte de um teatro para manipular 'votantes'. Para tais
"militantes" os valores ou o ideário deste ou daquele partido, bem
como a ética e as solidariedades que lhes deveriam ser inerentes, são sempre
secundarizados face ao objetivo supremo que é o de chegarem a lugares de
conforto pessoal que de algum modo os situe acima dos demais conterrâneos.
Mudar
para um outro partido mesmo que com valores diametralmente opostos é uma das
consequências naturais desta nova militância fundamentada na visão egoísta e
utilitarista dos partidos. Uma outra consequência é a criação de redes e
cumplicidades transversais a distintos partidos onde mais do que as
publicitadas diferenças sobreleva o comum entendimento individualista,
interesseiro e oportunista. São articulações e compromissos arquitetados na
sombra de uma espécie de comunidade de 'boys and girls' para quem os 'jobs', as
'cunhas' e as negociatas importam mais do que quaisquer diferenças ideológicas
ou partidárias.
Também
por isso, a salubridade da democracia é uma das dimensões em causa nas eleições
autárquicas.
A mudança necessária e possível
Em
Cascais a oposição tem, no próximo outubro, uma oportunidade excecional para
mudar o rumo da vivência municipal. Olhando para os números é expectável que o
Partido Socialista possa ter um papel essencial na construção de uma
alternativa aos desmandos da governação autárquica PSD/CDS.
Em
1993 a situação política nacional era bastante adversa porquanto dois anos
antes (1991) o PSD tinha obtido mais de 50% dos votos em eleições legislativas
e, todavia, o PS nas eleições autárquicas 'saltou' dos seus anteriores 15.200
votos (25%) para os 32.500 (43%) que lhe deram a vitória em Cascais.
Bastou
para tanto apresentar-se como uma verdadeira alternativa, com um projeto de
mudança e um candidato, José Luis Judas, que corporizava claramente a diferença
face ao PSD sendo alguém com projeção política nacional, capacidade de
realização e assumidamente de esquerda.
A
situação é hoje, para o PS, muito melhor quando, a nível nacional, o PS
desfruta de apoio maioritário e o PSD/CDS encontra-se muito fragilizado. Está
perfeitamente ao alcance do PS Cascais mobilizar o voto dos cerca de 31 000
eleitores que, no concelho de Cascais, votaram socialista nas legislativas de
2019 desde que se apresenta com um projeto e protagonistas confiáveis para a
mudança.
Ainda
com base nos números de eleições anteriores é expectável que a CDU eleja um
vereador. Do conjunto dos partidos da oposição atualmente representados na
Assembleia Municipal, além do PS, apenas a CDU deverá reunir condições para,
nas próximas eleições, eleger um vereador o que seria consequente com a
capacidade de resistência e persistência democrática que tem sido
constantemente evidenciadas pelo vereador Clemente Alves.
O
Bloco de Esquerda, o partido Pessoas-Animais-Natureza e outras candidaturas que
possam surgir provavelmente não reunirão condições para elegerem qualquer um
dos 11 vereadores da Câmara Municipal mas, certamente poderão ter reforçadas
representações na Assembleia Municipal e nas Assembleias de Freguesia.
É
neste quadro que mesmo que a coligação PSD/CDS consiga ficar em primeiro lugar
os partidos da oposição poderão dar início a um percurso de mudança que marque
uma rutura clara com o que foram os muitos anos de governação de Carlos
Carreiras: autoritarismo, betonização, despesismo, propaganda e incapacidade de
qualificação do concelho.
Os
cidadãos de Cascais esperam a diferença. Querem e merecem que o concelho deixe
de estar subordinado aos interesses da especulação imobiliária e do turismo
para que os cascalenses possam desfrutar de bem-estar e qualidade de vida em
plena liberdade.
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