Cascais: das escolhas individuais às políticas climáticas locais

Opinião




A nossa atmosfera está a alterar-se, essa é a realidade das alterações climáticas. Trata-se de um mal perverso, que afeta a vida humana, a vida animal e o equilíbrio dos sistemas terrestres e oceânicos. Os problemas perversos não passam com pequenos remédios, exigem uma abordagem holística e transformadora.

As alterações climáticas são também um tema pautado por várias incertezas. Os cenários climáticos apresentados no Quinto Relatório do Painel Intergovernamental das Nações Unidas apontam para um aquecimento da temperatura média global à superfície entre os 0,3ºC e os 4,8ºC até 2100 e um aumento do nível do mar entre os 2cm e os 2metros (dependendo dos cenários relativos à quantidade de carbono na atmosfera até 2100). Há contudo estudos recentes que consideram estas estimativas conservadoras.  


Mas segundo 15 mil cientistas ainda vamos a tempo de evitar uma situação catastrófica se assumirmos que para superar este ‘mal perverso’ será necessário um esforço coletivo, a múltiplos níveis e escalas de governação. 


Muito dependerá da eficácia de políticas implementadas pelos governos de todo o mundo para a redução de gases com efeito de estufa. Foi nesse sentido que as Nações Unidas mediaram o Acordo de Paris (em 2016), no qual quase todos os países do mundo (com a notória falta dos Estados Unidos) aceitaram regular as suas emissões de carbono, garantindo que o aumento da temperatura média global se mantenha abaixo dos 1,5 ou 2ºC. O Acordo visa ainda fortalecer a capacidade de resposta e a resiliência dos países face a alguns impactos das alterações climáticas considerados já inevitáveis. 
 

As metas do Acordo de Paris não serão fáceis de atingir. Um grupo de cientistas apresentou o itinerário ou ‘Roadmap’ a seguir e o resultado é desconcertante. Será preciso não só reduzir as emissões de carbono nos setores da Indústria, Transporte e Eletricidade, mas também grandes mudanças nos padrões de consumo e produção, no setor Agrícola e na Agropecuária (inclusive a redução do consumo de alimentos de origem animal), políticas de Reflorestação e finalmente desenvolver e implementar tecnologias de captura de carbono. 


Em Cascais, o aumento da temperatura média e de fenómenos climáticos extremos (chuvas intensas, tempestades, ondas de calor e frio), a crescente reemergência de doenças de transmissão vetorial (como a febre do Nilo) e a possibilidade de secas são alguns dos impactos esperados. 


Comparativamente aos desafios de Ílhavo e Vagos, onde um aumento nível do mar pode ser devastador dada a erosão costeira que já se faz sentir, ou à desertificação no Alentejo, Cascais não é o território português mais vulnerável ao problema das alterações climáticas. É contudo um dos municípios na vanguarda das políticas climáticas. 


Em 2010 foi apresentado o Plano Estratégico de Cascais para as Alterações Climáticas (PECAC), o qual projeta um aumento da temperatura média anual entre 1,7 e 3,2 graus Celsius até 2100, com uma subida de temperatura em meados do século na ordem dos 1 a 2ºC.


Cascais tem sido consistente na sua abordagem, depois do PECAC, desenvolveram-se estudos sobre medidas de adaptação, que deram origem ao recente Plano de Ação para a Adaptação para as Alterações Climáticas de Cascais. Mas apesar do bom trabalho já realizado, há ainda muito por fazer, tanto em Cascais, como no resto do país. 


Não basta haver estratégias e planos municipais específicos. Sendo um problema perverso, só será possível evitar o agravamento das alterações climáticas com uma política de mudança para um sistema socio-ecológico mais sustentável. Isto implica reduzir o consumo de produtos de origem animal, regenerar as estruturas ecológicas, proteger e promover a biodiversidade, e até repensar a construção e o ordenamento do território com uma visão de longo prazo.  


As alterações climáticas são um tema central para o PAN, que defende a continuidade e implementação das estratégias e planos locais (quando estes existem), bem como a elaboração de estudos de apoio às medidas que visam reduzir as emissões de carbono e adaptar os territórios aos impactos que já se podem esperar. 


O orçamento municipal de Cascais para 2018 integra uma das propostas do PAN para apoiar a redução de emissões no setor dos transportes: a substituição da frota de veículos municipais movidos a combustíveis fosseis por veículos elétricos. Foi também aprovada na Assembleia Municipal (no passado dia 18 de Dezembro), uma proposta do PAN para fortalecer a resiliência local a uma possível falta de água. Propõem-se estudos aprofundados sobre alternativas de fornecimento de água potável no município (onde 90% da água vem de Lisboa) e algumas medidas específicas (tais como a utilização de edifícios municipais para projetos piloto de captação de águas da chuva).


As políticas locais, regionais e nacionais são fundamentais, mas a ação coletiva de todos não pode ficar-se por aqui. A redução do consumo de alimentos de origem animal é essencial para a redução de emissões. A agropecuária e agricultura intensiva são responsáveis globalmente por 18% das emissões de Carbono por ano - mais do que o sector de transportes. É preciso agir face a esta realidade. 


Sendo um problema complexo, com múltiplas causas e com um impacte a diversas escalas, as alterações climáticas exigem uma política de longo-prazo e uma abordagem integrada e coerente, que passa tanto por políticas públicas, como pela inovação social e tecnológica e exige uma consciencialização de todos e ação coletiva que trave a exploração insustentável dos recursos vitais do nosso planeta.

*Deputada Municipal do PAN


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1 comentário:

Anónimo disse...

Temo que o PAN esteja a fazer alguma confusão entre documentos muito interessantes que a CMC manda fazer (compra) e aquilo que na verdade é a prática da CMC.
Na realidade a ação da CMC é sobretudo anti-ecológica e pró-betão.

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