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19 ABRIL 2020 |
António de Oliveira Salazar
Esta citação aos dias de hoje em que muitos de nós
estão em isolamento voluntário, de quarentena ou a trabalhar para manter os
serviços essenciais parece mais adequada a profissões do que propriamente a
géneros (aproveito para agradecer a todos os profissionais de saúde, forças de
segurança, trabalhadores do sector do retalho, transportadores de mercadoria,
professores que tentam manter as aulas online como conseguem, pessoas que ficam
em casa, que saem para o essencial ou porque têm mesmo de ser e sempre com todo
o cuidado, e outros tantos pelo empenho e dedicação nestes tempos difíceis).
Mas hoje tento recordar a nossa realidade de há cerca
de um mês, antes de todo este flagelo que nos aflige. Em 2018 Portugal foi
noticiado como o país da União Europeia (UE) no qual o fosso salarial entre
homens e mulheres mais cresceu. De acordo com o gabinete de estatísticas da UE,
entre 2011 e 2016 o fosso salarial entre homens e
mulheres cresceu 4,6%. As mulheres em Portugal ganham menos 17,5% que os homens, ou seja, por cada
euro ganho por um homem uma mulher ganha apenas 0,82€. Interessa referir que
segundo o estudo feito pelo economista
Eugénio Rosa, elaborado com base nos dados do INE, apesar as mulheres terem maior escolaridade e
qualificação, continuam a ser discriminadas a nível salarial e avança com
números bastante superiores aos fornecidos pela Comissão Europeia, 21,9%.
Dados mais recentes, de 2018, apontam que apesar dos tímidos avanços, a
desigualdade com base no género continua a ser uma realidade no planeta.
Segundo o Relatório, sobre Desigualdade de Género, divulgado pelo
Fórum Económico Social, Portugal surge com uma das piores posições: 103.º em
149.º
Quando falamos em diferenças salariais há uma
expressão muitas vezes repetida: Trabalho
Igual, Salário Igual. Esta expressão leva-nos a uma reflexão profunda,
porque de alguma forma é um facto que em todo o mundo as mulheres recebem menos
ao fazerem o mesmo trabalho que os homens. Mas se fazem o mesmo e ganham menos,
parece que as mulheres ganham menos por serem mulheres. Há uma palavra para
isso: Discriminação.
Quando uma
mulher adquire bens alimentares ou paga as suas despesas mensais, ela não tem
desconto equivalente à diferença/fosso que ganha relativamente aos homens. Se
uma mulher paga o mesmo que todos os outros e esse dinheiro sai do rendimento
do agregado familiar, significa que estas discrepâncias têm um efeito negativo
e directo nos rendimentos das famílias.
No entanto, a discriminação apenas explica
potencialmente uma pequena parte do fosso salarial existente entre homens e
mulheres. A maior parte das mulheres durante as décadas de 50 e 60, sobretudo
caucasianas, em várias partes do mundo, não trabalhavam fora de casa.
Em Portugal, durante o Estado Novo, a mulher era vista como uma
esposa devota e cuidadora do lar pelo que dificultou qualquer tentativa de
independência por parte destas. O emprego feminino era feito essencialmente em
fábricas e trabalhos menores. Às mulheres foi vedado o acesso a profissões
qualificadas como médicas, diplomáticas, de advocacia, etc. As poucas
mulheres a trabalhar não tinham claramente as mesmas habilitações e referências
que os homens, não tinham terminado os estudos ou nem tão pouco a oportunidade
de os iniciar.
Percebia-se na altura que algumas mulheres precisavam
de ganhar algum dinheiro, especialmente as solteiras. Mas uma carreira? Essa
era reservada aos homens.
No episódio número 18 do documentário Explained - Why Women Are Paid Less
produzido por Johnny Harris e Sarah Kliff
é explicado que nos Estados Unidos da América (EUA), era permitido aos empregadores colocarem anúncios
de emprego exclusivamente para homens e a disparidade salarial rondava os
0.60$. Esta diferença era causada por vários fatores interligados:
1.Baixo nível de escolaridade das mulheres;
2.Era perfeitamente legal pagar menos às mulheres;
3.Algumas ideias culturais sobre géneros e aptidões
como:
-A ideia de que a mulher era menos capaz e
inteligente;
-As mulheres não aguentam o poder;
-Profissões específicas para mulheres;
-O número reduzido de mulheres no mercado de trabalho;
-A ideia de que as mulheres deviam ser donas de casa;
-A aceitação que as mulheres deviam criar e cuidar dos
filhos e da família.
Em poucas décadas o cenário começou a mudar em muitos
países desenvolvidos (no caso de Portugal, após o 25 de Abril) com as
reivindicações de muitas mulheres que se organizaram. Deu-se uma vaga de
mudanças que permitiu a mulheres ingressarem em escolas que antes lhe eram
vedadas e ocupar cargos outrora destinados apenas a homens.

Basicamente muitos dos fatores acima descritos para as
desigualdades salariais começaram a diminuir e a dissipar-se à exceção de um: as mulheres geram os filhos. Daqui
assume-se que é à mulher que cabe o papel de cuidar e de criar os filhos. Mesmo
das mulheres que sejam médicas, advogadas, chefes de Estado, a sociedade
continua a esperar que sejam elas as responsáveis por criarem os filhos.
Nos
EUA, no Reino Unido e mesmo nos países progressistas do Norte da Europa,
apenas uma fração da população considera que as mulheres devem trabalhar a
tempo inteiro quando tem filhos pequenos. Mas quando se fala dos homens tudo se
inverte. 70% dos norte americanos, por exemplo, considera que um pai de filhos
pequenos deve trabalhar a full time. Infelizmente, uma grande parte da
população mundial continua a considerar que quando se é mãe não se devia trabalhar.
Essa visão já provou ser errada e limitada. Na
verdade, nada impede uma mãe, após regressar ao trabalho, de gerir melhor o seu
tempo porque este é limitado, para poder ir para casa estar com os filhos. Não
obstante, mesmo quando uma mulher é mãe e trabalha a full-time como o parceiro, ela na prática acaba por trabalhar mais
horas em casa a cuidar dos filhos e da casa do que o seu companheiro homem.
O mais recente estudo da Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Económico (OCDE) revela que as mulheres
continuam a gastar mais tempo do que os homens a fazer trabalho doméstico não
remunerado e, em todos os países, eles têm mais tempo de lazer. Nos salários,
os valores também não são famosos. Portugal ocupa o 3.º lugar. As portuguesas
passam 5h28 diárias a tratar da casa e dos filhos, enquanto os homens ocupam
apenas 1h36, a mais baixa da Europa depois da Turquia. Num ano isto equivale a
meses de um emprego a tempo inteiro não remunerado.
É este, a nosso
ver, o verdadeiro cerne do Fosso Salarial.
Para melhor compreensão, tomemos o exemplo dado no
episódio número 18 do documentário Explained
- Why Women Are Paid Less produzido por Johnny Harris e Sarah Kliff: Trajetórias de dois jovens alunos de direito,
um jovem casal constituído por um homem e uma mulher no início das suas
carreiras: eles são exactamente iguais, têm o mesmo percurso académico e a
mesma experiência. Quando na casa dos 20 ou 30 anos começam a pensar em ter
filhos. Se tiverem filhos nessa altura alguém tem de ficar em casa a cuidar das
crianças. Apesar de existirem creches privadas, não há em Portugal resposta
universal para todos bebés e crianças. Mesmo que consigam pagar uma creche ou
infantário um dos progenitores tem de ficar disponível nos primeiros tempos de
licença, quando a criança fica doente, ou tem consultas de rotina, ou ainda
quando há reuniões de Pais na escola.
Tendencialmente, será a mulher a fazê-lo (não
significa isto que em muitos casos não se verifique o oposto mas numa
percentagem muito reduzida). É de
referir que continuamos, em pleno século XXI, a ouvir relatos de expressões
proferidas por empregadores como: “então mas não pode ser a sua mulher a tratar
disso?”
Posto isto, é muito provável que ele seja promovido.
Ela por outro lado teve de recusar algumas tarefas, viagens de trabalho,
jantares com clientes fora de horas ou mesmo passar longos serões após o
horário laboral. Passados 8/10 anos geralmente ele já é sócio de alguma empresa
e pode fazer muito a partir dessa posição, enquanto que ela não se tornou
sócia, não ganha o mesmo, trabalha em horário flexível ou parcial e a partir
daqui os ganhos potenciais de ambos continuam a divergir. Isto é o que os dados
nos revelam, estudo após estudo em vários países. Num estudo dinamarquês é possível verificar como o nascimento afeta
o rendimento. Os gráficos são claros: o impacto na trajetória salarial de um
homem que foi pai é nulo mas no caso da mulher tudo se inverte.
Por outro lado, ao compararmos a trajetória salarial
de uma mulher com filhos e outra sem filhos vemos que a disparidade e o
fosso não têm tanto a ver com ser mulher mas antes com o ser Mãe. Mulheres
que não são “cuidadoras”, ou seja que não têm filhos, ganham 96% de cada
dólar/euro ganho por homem.
A disparidade
de género revela-se maior entre mulheres com filhos e todas as outras pessoas.
Esta é uma sociedade que penaliza a maternidade.
Estamos constantemente a pedir às mulheres que escolham entre a maternidade e a
carreira. Algo que aos homens nunca é sequer equacionado. Do mesmo modo que
ninguém pergunta numa entrevista de trabalho a um homem se pensa ter filhos ou
constituir família, algo que acontece com muitas mulheres. É comum infelizmente
ouvir comentários infelizes de colegas e “chefias” quando uma mulher exerce os
seus direitos de maternidade. Comentários como “então grandes férias” por
exemplo. Do mesmo modo pais que contrariam a dita “norma” e querem usufruir dos
seus direitos, e acompanhar verdadeiramente os seus filhos, por exemplo nas
consultas, ouvem comentários maliciosos como “mas a tua mulher não pode tratar
disso?!”. Poder pode mas e não terá direito o Pai também?
Interessa referir que especialistas em estudos de
género debateram os resultados do trabalho da Fundação Francisco Manuel dos Santos,
que traça um retrato atual das mulheres portuguesas. Este estudo evidencia que
as “Desigualdade de género estará a afetar a natalidade em Portugal”. Existe
uma realidade obscura mas muito
real presente no mundo laboral: o medo
de represálias no trabalho caso engravidem. Penalizações graves na progressão
da carreira ou bullying por parte da entidade patronal.
É certo que muitas mães não veem isto como um
problema, até porque querem passar tempo com os seus bebés e não se importam
que isso signifique ganhar menos. Há quem tome decisões profissionais a pensar
em constituir família e não há nada de errado nisso. Temos de ter sensibilidade
para perceber as especificidades que este assunto pode acarretar, ou seja, se
virmos este fator sociocultural apenas como uma penalização da sociedade,
corremos o risco de negar que muitas mulheres assim o escolhem e de que estamos
a falar de algo extremamente valioso, não apenas para as crianças e para as
famílias, mas também para as próprias mulheres.
Mas uma disparidade salarial baseada em escolhas é
diferente de uma disparidade baseada no simples facto de ser mulher e não
receber o mesmo pelo mesmo trabalho que um homem faz. O problema aqui é que é
na mulher que recai a escolha entre a maternidade e a carreira. A pergunta que
colocamos é: com isto qual é o lugar de mulheres que querem ter filhos e
simultaneamente ter uma carreira?
Chamo a atenção para que segundo o Índice de Normas Sociais e de Género, publicado pelo
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, que avaliou 75 países que
abrangem cerca de 80% da população mundial, “nove
em cada dez pessoas têm preconceitos contra mulheres”. Isto significa que
metade destes preconceitos vem de mulheres. Não há fórmulas perfeitas e o
julgamento entre mulheres que optam em família por ficar em casa ou as que
optam por não ter filhos devem ser respeitadas na mesma medida. Uma coisa são escolhas
livres e conscientes e medidas que permitam a conciliação da carreira e da
parentalidade tanto para homens como para mulheres, coisa diferente são os
condicionamentos ligados ao gênero.
Sabemos também que frequentemente homens e mulheres
não têm as mesmas escolhas ou as mesmas oportunidades. Nos EUA há 3 vezes mais
mães sozinhas (e não “solteiras”, pois não devemos permitir que a condição de
mãe seja definida pelo estado civil) do que pais sozinhos. Na infância, a
maioria das mulheres recebe a mensagem de que cuidar e tratar dos filhos é mais
uma tarefa de mulheres, conforme explicámos anteriormente.
Mais, apesar da conciliação do trabalho com a família
ser de ser um direito consagrado na lei, de acordo com o inquérito sobre a qualidade de vida na Europa feito em
2016 pela Eurofound (Fundação Europeia para a Melhoria
das Condições de Vida e de Trabalho) o problema dessa conciliação é sentido
mais por mulheres (33%) do que por homens (11%).
Vejamos o exemplo o estudo
“As mulheres em Portugal, hoje“, coordenado por Laura Sagnier e Alex Morell, e com uma
amostra de 2.428 mulheres com idades entre os 18 e os 64 anos e residentes em
Portugal, entrevistadas em maio de 2018, através da internet. “Portugal
precisa de pelo menos cinco gerações para os homens partilharem as tarefas
domésticas em igualdade com as mulheres, que, na maioria, assumem, num estudo
revelado esta terça-feira, estar sempre ou quase sempre “cansadas”.
No mesmo documentário que referi anteriormente e no
caso dos jovens advogados em início de carreira Hillary Clinton dá como exemplo
disto uma coluna de aconselhamento dos anos 80 sobre a decoração da secretária
do escritório, que ainda hoje é válida (por incrível que pareça):
- Se for um homem e tiver
família, decore a sua secretária com as fotos de família. Porque isso mostrará
que é um bom “provider”, ou seja que traz sustento à sua família;
- Se for uma mulher e tiver
família não coloque fotos de família. Porque vão pensar que não se consegue
concentrar no trabalho.
Vejamos a realidade ao dia de hoje: homens e mulheres
a braços com uma Pandemia fazem o que conseguem para tentar colmatar o fecho
das instituições de ensino, a lida da casa, as refeições, o teletrabalho ou
noutros casos o desespero da distância e do perigo para os seus entes queridos
porque no seu trabalho o isolamento social voluntário pura e simplesmente não é
opção. De repente já “não achamos que são férias”. Agora a mulher que ficou em
casa a cuidar dos filhos ou a que tentou conciliar a maternidade, um casamento,
uma carreira e a sua identidade já não parecem “estar de férias”. Estar em casa
com crianças não são férias é trabalho e dá trabalho, muito trabalho. É sim
prazeroso mas também assustador e esgotante. Claro que é uma experiência que
vale a pena, mas seria muito melhor se fosse partilhada e vivida a dois e em
família.
Partilho o artigo que mostra o relato de pessoas reais em Portugal
onde se pode ler “Obsessão pela desinfeção de tudo,
perda de apetite, chorar às escondidas, cansaço geral e conflitos familiares
são algumas das situações que os pais que estão em isolamento com os filhos e
em teletrabalho confessam sentir na primeira semana de combate à pandemia
Covid-19.” A saúde mental também é importante nesta altura. Podemos reflectir
sobre a forma como a sociedade tem tratado a maternidade através desta
experiência.
As raízes deste problema são profundas. Assentam sobretudo
na forma como vemos as famílias, as mães e os pais. Por isso é tão difícil
acabar com a disparidade salarial e a diferença de oportunidades. Mas não é
impossível.
A Islândia quase acabou com esse fosso em apenas
algumas décadas. Ao observar este exemplo, tiramos lições importantes de como é
possível criar uma sociedade onde homens e mulheres ganham o mesmo e tenham
acesso às mesmas oportunidades.
O exemplo da
Islândia
A pequena nação insular da Islândia deu importantes
passos para acabar com o fosso salarial. O ponto de viragem deu-se em 1975. As
mulheres abandonaram em massa os seus postos de trabalho e foram para as ruas
reivindicar direitos e salários iguais. Com elas ausentes as empresas fecharam.
O que deu origem a uma vaga que pouco a pouco começou
a mudar a sociedade. O resultado foi que as mulheres começaram a tornar-se mais
visíveis na política. Apenas 5 anos depois da grande greve, a Islândia teve a
sua primeira presidente mulher eleita democraticamente, Vigdís Finnbogadóttir.
O número de mulheres no parlamento islandês disparou o que levou a muitas
mudanças políticas nos anos seguintes.
Em 1981, a Islândia criou uma lei que obrigava os
empregadores a dar uma licença de 3 meses de maternidade às mães, que foi
estendida para 6 meses em 1988. A licença de maternidade à época era uma
novidade e a Islândia era um dos países mais generosos do Mundo. Mas embora
esta lei fosse progressista encorajava as mães a ficarem em casa a cuidar dos
filhos enquanto que os pais continuavam a trabalhar, reforçando as normas
culturais no âmbito do fosso cultural: de que as mulheres são cuidadoras e
os homens não.
Então os
legisladores fizeram algo “radical”. E se dessem uma licença parental igual aos
pais e os obrigassem a usar esses benefícios para não perderem direitos? A Islândia passou esta lei no ano 2000.
A Licença Parental Obrigatória fez toda a diferença na
cultura dos homens islandeses. Uma diferença muito positiva. Espera-se que os
homens das novas gerações fiquem em casa para cuidar dos filhos. Isto faz toda
a diferença tanto em casa como no mercado de trabalho. Porque passa a ser
expectável que quando contratamos uma jovem mulher ou um jovem homem ambos
usufruem dessa licença.
Em 2004 a diferença salarial da Islândia era igual à
dos EUA (0.81$) mas nos anos que se seguiram o fosso desta disparidade foi
diminuindo até chegar aos dias de hoje. As Islandesas hoje faturam 0.90$ por
cada dólar que um islandês ganha (sendo que os EUA mantém os 0.81$).
Por isso, sabemos que não é impossível reverter esta
disparidade salarial, mitigar a discriminação na contratação e promover a
igualdade parental. Isto é bom para as pessoas, para as famílias, para as
empresas e, naturalmente, para o Estado.
Mudar a expectativa de que devem ser as mulheres a
cuidar dos filhos exigirá outra mudança de paradigma. Na perspetiva de quem
debate estas questões. Esta mudança deve começar com os homens. Como afirma
Anne-Marie Slaughter no episódio número 18, do documentário Explained - Why Women Are Paid Less, “enquanto
não encararmos homens e mulheres ambos como cuidadores e quem sustenta a
família não chegaremos lá. Porque
enquanto for um “problema de mulheres”, estaremos a reforçar o estereótipo de
que cuidar dos filhos é função delas. O fardo apenas será menor para as
mulheres quando os homens conseguirem na sua grande maioria dizer: “olha eu vou
aquela reunião da escola e quero mesmo ir com o meu filho à consulta de
rotina.”
O fosso
salarial não é apenas um problema das mulheres é um problema das famílias.
Esta medida pode simultaneamente combater a
desigualdade salarial, igualar as oportunidades de progressão na carreira entre
homens e mulheres e terminar com a
discriminação de género na contratação laboral e empoderar os pais na educação
dos filhos. As mulheres tal como os homens tem todo o direito de serem mães sem
serem penalizadas no trabalho. Isto empodera as mulheres no mercado de
trabalho, e os homens na educação dos filhos. Isto sim é igualdade.
Ao
contrário do que defendia António de Oliveira Salazar, nós acreditamos que
ambos os progenitores podem lutar fora para providenciar sustento e ambos devem
poder prestar cuidados dentro do lar. Porque o pilar de uma família está na
igualdade e dar direitos aos pais é dar direitos às mães, ganha a família.
A estratégia da Islândia não se ficou por aqui. Em
Março de 2017 uma nova lei inovadora foi aprovada e deu continuidade à
mitigação da desigualdade salarial entre homens e mulheres. A sua implementação
deu-se logo no primeiro dia de 2018. Todas as empresas públicas e privadas que
tenham mais de 25 funcionários passaram a ter de apresentar um certificado
oficial de cumprimento de uma política de igualdade salarial. A Islândia passou assim a ser o primeiro país no mundo a
tornar obrigatória a igualdade salarial entre homens e mulheres.
As empresas que não respeitarem a lei - ou seja, que continuem a pagar mais a
homens do que a mulheres que desempenham as mesmas funções - serão multadas
pelo Estado. Mas para isto acontecer teve que haver mudanças legislativas para
condicionar o mercado a adaptar-se aos dados científicos, psico sociais e
económicos, existentes sobre a matéria. Este é mais um sinal que o mercado por
si, sem intervenção, não funciona.
Podem parecer medidas radicais mas os números falam
por si e hoje a Islândia é o país mais bem cotado
no Fórum
Económico Mundial quanto à
igualdade salarial entre géneros enquanto Portugal surge ainda na 33º posição. Segundo o relatório sobre Desigualdade de Gênero, divulgado
pelo Fórum Económico Social, de 2018, a
Islândia voltou a ocupar o primeiro lugar. O estudo tem em conta fatores como o
empoderamento político, a igualdade nos salários, na saúde e na educação.
O relatório do Progresso da Igualdade entre Mulheres e
Homens no Trabalho, no Emprego e na Formação Profissional que emana da Comissão Para a
Igualdade do Trabalho e no Emprego para o ano de 2016 já apontava para cerca de
118 anos o tempo necessário para que o mundo pudesse acabar com a desigualdade
salarial entre homens e mulheres (só quando o mercado funciona por si). No
entanto a Islândia continua a batalhar para terminar com estas desigualdades e
pela sexta vez consecutiva desde 1975, no dia 25 de outubro de 2018 milhares de mulheres islandesas
abandonaram os seus postos de trabalho às 14:55 e foram
para o centro da capital, reivindicar o fim da disparidade salarial. A razão para o
horário escolhido é simbólica prende-se
com o facto às 14h55 em ponto, as
mulheres islandesas deixarem de ser pagas precisamente a partir desta hora. O
objectivo da Islândia é muito claro: 2020 é a data traçada como meta para
erradicar completamente qualquer diferença salarial entre homens e mulheres
demonstra que com algumas medidas de “alavanca” é possível encurtar esse prazo.
Também não é por acaso que a
Islândia é o 4.º país com a classificação mais elevada no ranking do 2018 World Happiness Report. Portugal ocupa o 77.º lugar atrás de
países como a Turquia, o Kosovo, o Cazaquistão, a Rússia, o Peru, a Roménia, a
Arábia Saudita, entre outros. A Finlândia também está na linha da frente e já anunciou
que a mudança será introduzida em 2021 e visa dar a
todo o tipo de famílias, independentemente do formato, as mesmas licenças de
parentalidade, de modo a promover a igualdade de género.
O PAN contemplou no seu programa eleitoral, na medida n.º1006
que se iguale a licença parental de ambos os progenitores. O dia Internacional
da Mulher, 8 de março é geralmente marcado por excelentes declarações em todos
os quadrantes políticos. A boa fé destas intervenções quando não acompanhadas
de medidas efetivas para mitigar as desigualdades salariais de género que
persistem acabam por ter um papel meramente simbólico, que fica bem na
fotografia mas sem impacto na vida de tantas mulheres e famílias.
Em 2019, o Dia Nacional da Igualdade Salarial
assinalou-se a 8 de Novembro. Como se pode verificar na notícia do Público
“A data marca o número de dias extra que as mulheres têm de trabalhar para
atingirem o mesmo salário que os homens até ao final do ano. É como se entre
esse dia e 31 de Dezembro, as mulheres deixassem de ser pagas pelo seu
trabalho.”
Assim, e tendo em conta estes factos e dados,
consideramos que não precisamos de mais décadas para mudar esta realidade
Portuguesa e sermos um país mais próspero e feliz.
O COVID-19 têm trazido o melhor e o pior da humanidade
e espaço para introspecção e reflexão. Concordado com o biólogo e consultor internacional Daniel Christian Wahl “seria um erro
simplesmente regressar ao sistema económico vigente. Não se trata de sobreviver
ao vírus e refazer o sistema como o tínhamos, porque as mudanças climáticas e a
emergência climática já nos estavam a dizer que o sistema não funcionava e os
níveis quase obscenos de desigualdade no planeta, com tantas pessoas
extremamente pobres e poucas muito ricas, também era insustentável. Podemos,
então, aproveitar esta oportunidade que a crise do vírus nos está a dar para
redesenhar os nossos sistemas económicos, de forma a que realmente sirvam as
pessoas e o planeta”. Isto serve também para a desigualdade salarial e para as
questões da parentalidade entre géneros.
Precisamos
mudar e só falta mesmo a vontade política.
*DEPUTADA MUNICIPAL DO PAN
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*Os artigos de opinião publicados são da
inteira responsabilidade dos seus autores e não exprimem, necessariamente, o
ponto de vista de Cascais24.
1 comentário:
As 35 horas.
Este artigo pretende expor um particular ponto de vista sobre as 35 horas, ou seja sobre a diminuição do horário de trabalho tendo em vista este limite. Comecemos então por fazer uma caracterização socio-histórica do horário de trabalho nos últimos decénios em Portugal.
A questão do horário de trabalho e seu constante debate foi sempre polémica.
O horário de trabalho foi sempre de facto muito longo na primeira metade do século XX, e isso é pouco contestado e defendido por todos os especialistas em direito de trabalho que estudam o caso português
Nas primeiras duas décadas da segunda metade do século XX fora realizados alguns esforços que o permitiram encurtar apesar de ainda subsistir na final da década de sessenta a “semana-inglesa” em alguns sectores da indústria e do comércio. Na década de setenta e oitenta foram de facto, feitas muitas alterações ao nível das leis laborais, o que permite caracterizar esses primeiros vinte anos do após 1974 como progressistas.
Mais recentemente, e já no início do séc. XXI, aprovaram-se dois grandes pacotes de alterações às leis laborais, primeiro com a elaboração do novíssimo código do trabalho em 2003, e depois com o “aggiornamento” e implementação do código de trabalho de 2009. É esta moldura legislativa que permite agora alguma margem de manobra para que se possa implementar em sectores do mundo laboral, as 35 horas, e talvez a partir daí imprimir uma dinâmica de crescimento económico e social.
Agora perspectivam-se as reacções das organizações sociais ligadas ao mundo laboral, e mais importantes as determinações oriundas da concertação social em que estão representadas as organizações patronais e sindicais. As 35 horas não são uma experiência inédita, nem na Europa nem em Portugal, todavia aguarda-se, a concretização da lei no quotidiano das empresas para continuá-la.
Esteves, Ayres
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