OPINIÃO
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22 janeiro 2023 | 15h12 |
Todos estes casos, em tão curto espaço de tempo e abrangendo largo espectro político, vêm consolidar a perceção popular de que as câmaras municipais são um antro de corrupção.
Corromper nas autarquias é demasiado fácil, demasiado tentador e não escrutinado.
É demasiado fácil
É demasiado fácil porque existem formas de favorecer particulares sem grande complexidade administrativa ou política, podendo em muitos casos ser justificado como ato de boa gestão.
O autarca tinha um problema premente para resolver e passou por cima de todas as regras contratuais de forma a assegurar o fornecimento de um bem. Resolveu o problema e o eleitorado ficou contente. Não precisa de divulgar que ganhou 10% no negócio.
Também aquele que altera uma linha num PDM com a justificação de estar a atrair um importante investimento para o concelho, parece que decidiu bem. Não precisa de dizer que valorizou um terreno em milhões de euros e, sobretudo, que lhe coube uma pequena parte.
É demasiado tentador
É demasiado tentador porque um presidente de Câmara ganha menos que o gerente de uma agência bancária e uma única alteração ao PDM ou adjudicação de contrato rende-lhe mais do que um ano inteiro de ordenado.
Não é escrutinado
E são decisões pouco e mal escrutinadas. A nível da fiscalização legal dos procedimentos seguidos pelas autarquias existia um organismo específico para o efeito, a Inspeção-Geral da Administração Local, que realizava com regularidade ações inspetivas às câmaras municipais. Só que existia, já não existe. Efetivamente, em 2012 foi decretada a sua integração na Inspeção-Geral de Finanças e foi extinta. Acontece que a IGF tem como prioridade a cobrança de impostos e ir atrás dos contribuintes faltosos. A inspeção da legalidade da atuação das câmaras ficou para depois.
Também a nível político o escrutínio é superficial. Os membros da vereação eleitos pelas oposições têm pouco acesso à informação e, quando o têm e querem manifestar desacordo com algum projeto, a sua capacidade de ação resume-se a ditar para a ata os motivos desse desacordo. Excetuando nos concelhos de Lisboa e Porto, em que a comunicação social está presente, nas restantes 306 câmaras do país os vereadores que querem fazer oposição têm uma tarefa absolutamente inglória. Por isso tantos se passam tão depressa para o lado do poder.
E as assembleias municipais? Aqui, para além das dificuldades de acesso à informação, a maioria dos membros são escolhidos pelo próprio presidente da câmara. De quem dependem no seu futuro político e, amiúde, no seu presente profissional. Não se espere que daqui venha uma oposição atenta.
A oposição mais eficaz acaba por ser realizada por grupos cívicos, mais ou menos informais, que se mobilizam em função de alguns assuntos e que têm de gritar para se fazer ouvir.
Esta ausência de escrutínio é um mal de raiz e faz mal à Democracia. Decorre de um sistema que o permite, não é um problema desta câmara ou daquela.
Tenho para mim que a corrupção nas autarquias só acabará quando não for tão fácil, não for tão tentador e o poder político for escrutinado.
*(Ex-Vereador na CMCascais)
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1 comentário:
Só posso aplaudir!!!
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