OPINIÃO
![]() |
08 MARÇO 2021 |
Neste longo período, a coligação PSD/CDS sempre obteve maioria absoluta e Carlos Carreiras pôde impor no concelho o estilo e o projeto de governação que quis. Especialmente desde que, em 2011, afastou António Capucho e assumiu a presidência, passou a governar Cascais essencialmente ao serviço dos negócios do turismo e da especulação imobiliária.
Esta
última, catalisada pelo processo de gentrificação do território, permitiu-lhe
'engordar' enormemente o orçamento da Câmara no qual herdou reduzidas despesas
fixas de pessoal e que já ultrapassou os 220 Milhões de euros anuais. Foi-lhe, assim, possível construir um
influente poder partidário alicerçado num reconhecido despesismo de eventos,
numa vigorosa ação de propaganda e numa ardilosa política de subsidiodependências
com o qual constitui um albergue para centenas de militantes partidários
com emprego na Câmara, nas várias empresas municipais e em diversas outras
instituições dependentes do Município.
Independentemente
da análise, politicamente pouco relevante, de quaisquer traços de personalidade
de Carlos Carreiras certo é que esta arquitetura de poder absoluto induziu o
concelho numa vivência crescentemente 'caudilhista' e autocrática que só não é
abertamente antidemocrática porque o contexto nacional não o permite. No
exercício do seu absolutismo, o presidente camarário nunca encontrou
qualquer obstáculo político porquanto na Câmara e na Assembleia a sua
maioria sempre lhe dispensou total apoio e a malha tentacular de dependências e
cumplicidades garantiu-lhe a crescente desertificação social participativa.
Assim,
o PSD/CDS nunca enfrentou problemas reais por manter o status quo nesta
Câmara bastante rica que nada de significativo fez pela qualificação do
concelho ou pela melhoria de vida dos munícipes, que promoveu a desenfreada
betonização, que assistiu impassível ao agravamento da mobilidade e que
patrocinou a deterioração ecológica.
Apesar
das vozes e forças que ainda resistem e merecem, por isso, a maior
consideração, não foi difícil à maioria absoluta marginalizar e perseguir
de múltiplas formas quaisquer uns que, com muito diversas opções políticas,
ousassem contestar ou sequer criticar o poder absoluto implantado em Cascais.
Foi este
quadro de total domínio do PSD/CDS que ficou abalado pelo resultado das
recentes eleições presidenciais. Se não vejamos sucintamente.
O
quadro de resultados das ultimas eleições autárquicas (2017) foi o seguinte:
|
Votos |
Percentagem |
Vereadores |
PSD/CDS |
35.520 |
45,9% |
6 |
PS (+
Indep.) |
22.490 |
29,0% |
2 (+
2) |
PCP |
5.759 |
7,5% |
1 |
BE |
4.056 |
5,3% |
|
PAN |
3.529 |
4,6% |
|
Ind. |
1.628 |
2,1% |
|
MRPP |
466 |
0.1% |
|
Votantes |
77.325 |
|
|
Abstenção |
|
56,5% |
|
Entretanto, nas recentes eleições presidenciais o partido de cariz fascista recolheu, no concelho de Cascais, 13.338 votos.
Há
razões para crer que a maioria destes votos vieram de anteriores eleitores do
PSD/CDS.
Dado
que o designado 'Chega' já fez saber que irá apresentar o seu número dois (um
expoente dos saudosistas da extrema direita) como candidato à Câmara de Cascais
tudo indica que a lista de Carlos Carreiras não irá ultrapassar os 23.000
votos correspondendo a cerca de 31% do eleitorado.
Esta
será a situação previsível da coligação de direita se a "nova"
Iniciativa Liberal se juntar ao PSD/CDS porque se esta concorrer autonomamente
a votação de Carlos Carreiras será ainda mais afetada.
Com uma votação desta ordem de grandeza a coligação PSD/CDS(/IL ) poderá obter entre 4 a 5 vereadores. Como a Vereação da Câmara é constituída por onze vereadores a coligação de Carlos Carreiras perderá a maioria absoluta. Na Assembleia Municipal a situação, apesar de mais plural, será idêntica.
O modelo de gestão camarária de Carlos Carreiras dificilmente se coaduna com qualquer outra prática que não o conhecido "quero-posso-e-mando" inviável sem maioria absoluta.
É
verdade que Carlos Carreiras pode aliar-se com Pacheco Amorim para uma
repartição de poderes no concelho estribada numa nova maioria absoluta. Mas,
talvez porque perceba que isso seria o seu suicídio político, o atual
presidente da Câmara já veio afirmar-se publicamente contra uma coligação com o
Chega. Veremos…
É neste quadro que as próximas eleições autárquicas se perspetivam.
Obviamente (basta olhar para os números) que, se as oposições convergissem numa alternativa comum, a coligação de direita seria derrotada. Para isso seria necessário um projeto de mudança claro e comummente delineado com uma partilha equilibrada de responsabilidades. Como se desconhece se durante os últimos anos foram construídas pontes e alicerçadas confianças mútuas indispensáveis para uma tal solução fica-se na expectativa de saber se uma tal resposta à fraqueza do PSD/CDS irá acontecer.
Há sempre a hipótese de o Partido Socialista voltar finalmente a uma candidatura ganhadora. Se (mas, só se) a direção nacional do PS estiver disposta a apresentar um(a) candidato(a) e uma equipa com perfil suficiente para mobilizar o apoio dos cerca de 31.400 (31,7%) cidadãos que, no concelho de Cascais, votaram no PS nas eleições legislativas de 2019, então o PS pode aspirar a ganhar as eleições autárquicas.
É
evidente que uma tal candidatura não iria ter quaisquer votos do eleitorado
mais à direita porque esse, além da coesão que sempre demonstrou em anteriores
eleições autárquicas, vai ser chamado, com várias justificações, ao "voto útil"
em Carlos Carreiras.
Todavia,
é evidente que uma candidatura do PS que mereça a confiança do eleitorado de
esquerda e com protagonismo de dimensão nacional, pode obter sucesso numa
ocasião quase única em que à fragilidade do PSD e à quase-extinção do CDS
se associa uma elevada credibilidade nacional do PS.
Caso o PS não queira uma tal candidatura, então a questão que se coloca em Cascais é saber se tudo irá continuar na mesma ou se as eleições vão criar condições para uma outra vivência democrática suscetível de abrir caminho a uma alternativa futura.
Dito de
outro modo, irá o PSD e a sua rede tentacular continuar a asfixiar o concelho e
a fazer os desmandos que entende ou, vai a oposição agir determinadamente
para impedir tal situação e construir um projeto efetivamente alternativo sem qualquer confusão com o
pensamento, os interesses e a ação local da direita ?
Manter o poder autocrático do PSD/CDS ou combatê-lo é a questão que importa à defesa dos cascalenses.
Não
será preciso muito para se compreender que o futuro no concelho depende desta opção.
Seguramente que os próximos meses serão interessantes para acompanhar e avaliar a vida política em Cascais.
*Os artigos de opinião publicados são da inteira responsabilidade dos seus autores e não exprimem, necessariamente, o ponto de vista de Cascais24.
2 comentários:
Mesmo após o escrutínio que a IL faz aqui em Cascais acha que a IL alinha numa geringonça a direita???
Entre o IL e o PSD/CDS há afinidades ideológicas e estes já mostraram que não olham a meios para preservar o seu poder.
No atual mandato vimos que dois dos independentes eleitos na lista do PS aceitaram passar para a maioria PSD/CDS.
Já em 2011 também um então vereador do PS aceitou ficar com pelouros e passar a apoiar a maioria PSD/CDS.
O mesmo já acontecera no mandato anterior com uma outra vereadora do PS.
Será que o IL é mais resistente aos 'sedutores' tentáculos do poder?
Se for então Carlos Carreiras tem um berbicacho ainda maior entre mãos. Como o resolverá ?
Vasco Graça
Enviar um comentário